JOVEM RD

Rodrigo, mais conhecido como Jovem RD, nasceu em 2000 no Grande ABC paulista, em Diadema (SP), onde viveu até os 17 anos. Filho de nordestinos, cresceu em uma casa onde a música era diversa: de um lado, a família ouvia Amado Batista e MPB; de outro, seu irmão – considerado a “ovelha negra” – introduzia o rap e nomes como Sabotage. Foi essa convivência que despertou cedo o interesse do jovem Rodrigo pela música. Aos seis anos, em 2005, teve seu primeiro contato com o rap, ouvindo “Rap do Trem”, do RZO. Fascinado pela ideia de “surfar no trem”, enxergava os MCs como super-heróis.

Apesar da influência musical, sua infância e adolescência em São Paulo foram marcadas por dificuldades. Na escola, sofria bullying constante por ter tiques nervosos – piscava demais, balançava a cabeça –, o que tornou esse período um dos mais desafiadores de sua vida. Ainda assim, completou o ensino médio e chegou a iniciar o ensino superior, que mais tarde trancaria.

Em 2018, sua vida mudou quando se mudou para Miguel Couto, em Nova Iguaçu (RJ). No início, a adaptação foi difícil: não tinha amigos, nem referências culturais, e sentia o bairro carente de iniciativas artísticas. O destino, no entanto, reservava uma surpresa. Em uma noite, caminhando sozinho para se distrair, deparou-se com uma batalha de rima “clandestina”. Já havia assistido a batalhas pelo YouTube e decidiu se arriscar. Foi ali, no fim de 2019, que nasceu o MC Jovem RD, oficialmente inserido na cultura hip-hop.

Miguel Couto passou a ser o território de sua transformação. Inicialmente visto com preconceito – batalhas eram consideradas “coisa de vagabundo” –, o bairro hoje reconhece RD como “o da rima”. No mercado, no açougue, em qualquer esquina, ele é chamado assim. A identidade artística se confundiu com a pessoal: “O Rodrigo morreu. Hoje sou o Jovem RD”, afirma.

Especializado em batalhas de rima, RD também experimentou outros elementos do hip-hop, como o break e o graffiti, mas se encontrou na música. Tocou violão, aproximou-se da MPB, mas foi no rap que descobriu sua voz e seu propósito. Seu primeiro reconhecimento financeiro veio apenas em 2023, quando venceu uma batalha no Instituto Chrizan, recebendo 400 reais – valor que reforçou sua decisão de seguir carreira, mesmo que demorasse a repetir conquistas semelhantes.

A trajetória não foi linear. Quando sua esposa engravidou, afastou-se temporariamente do hip-hop, pressionado pela necessidade de sustentar a família. Sem berço ou quarto para o filho que estava por vir, pensou em desistir. Mas, como ele mesmo descreve, “o hip-hop é uma das drogas mais viciantes que existem”, e não conseguiu ficar longe por mais de seis meses.

Um dos episódios mais marcantes de sua carreira foi levar MaQueen, jovem de Miguel Couto, para a maior batalha do Rio. Ver aquele garoto ser reconhecido foi, para RD, a prova de que a arte podia transformar destinos e gerar impacto no território. Ele próprio também conquistou espaço, firmando-se em algumas das batalhas mais relevantes da cidade sem se vender, sem “apertar a mão de racistas ou opressores”. Esse compromisso ético, embora tenha tornado o caminho mais longo e difícil, é um dos orgulhos de sua trajetória.

RD reconhece a importância da coletividade na sua formação. Amigos e colegas de Nova Iguaçu foram os primeiros a acreditar em seu talento, incentivando-o a voltar semana após semana às batalhas. A partir desse círculo, surgiram novas referências e inspirações, como MaQueen e Índio. Para ele, inspiração é combustível: “Se não fosse ver um moleque da minha área rimando bem, talvez eu não teria voltado na semana seguinte”.

Além das batalhas, também atuou em oficinas pelo Sesc e Senac, aproximando jovens de elementos do hip-hop e despertando novas vocações. Nessas experiências, percebeu a potência do movimento como ferramenta educativa e social, ainda que, como ele mesmo ressalte, muitas vezes os artistas recebam apenas “ajuda de custo” em vez de remuneração justa.

“O Rodrigo morreu. Hoje eu sou o Jovem RD.” “No mercado, no açougue, na boca: eu sou o da rima.” “Foi como se eu tivesse aceitado Jesus: eu morri pro mundo e nasci pro hip-hop.” “Eu quis me firmar sem apertar a mão de racista, sem apertar a mão de opressor, sendo eu.” “O hip-hop é resistência: um homem negro de black, short, tactel e havaiana chegando onde só gente de terno chega.” “A rua foi minha maior escola: você não precisa ser mal, mas é bom conhecer a maldade.” “Não esqueçam de quem pavimentou esse chão pra vocês estarem pisando.” “Quando você não tem dinheiro, seus amigos são seu capital.” “Não ande sozinho. Porque você vai cair. E precisa de alguém pra te levantar — e você também vai levantar os outros.”

Não esqueçam de quem pavimentou esse chão pra vocês estarem pisando.

Seu estilo é marcado pela liberdade de expressão e pela crítica social, mesmo em ambientes onde essa postura é vetada. RD denuncia a presença de políticos – inclusive de direita – financiando rodas culturais, impondo limites à fala dos MCs. Para ele, a essência do rap está em falar o que se pensa, e perder essa liberdade é transformar um sonho em pesadelo.

Leitor assíduo, encontrou nos livros uma forma de cuidar da saúde mental. A leitura se tornou um refúgio e um tratamento paralelo à terapia, ajudando-o a lidar com os desgastes emocionais que a carreira artística impõe. Na vida pessoal, equilibra o papel de MC com o de pai e marido. Seu filho, pequeno, já o assiste no YouTube; seu pai o acompanha pelas redes sociais, comentando vitórias e derrotas. O hip-hop, diz ele, não mudou apenas sua vida, mas também a de toda sua família.

Quando pensa no futuro, RD sonha em viver de arte e sustentar sua família apenas com a música. Reconhece que hoje “sobrevive da arte”, mas acredita que, em breve, essa realidade pode mudar. Para a próxima geração, deixa duas mensagens: não esquecer de quem pavimentou o caminho e entrar no hip-hop de coração, com estudo e consciência. Sua herança desejada é manter viva a essência da velha escola – “se pudesse deixar algo, seria um disco de Sobrevivendo no Inferno, dos Racionais MC’s”.

Hoje, Jovem RD se define como o MC da Baixada: um dos poucos a conquistar espaço nas maiores batalhas do Rio, sem abrir mão de seus princípios. Sua história sintetiza a resistência, os dilemas e as conquistas do hip-hop de Nova Iguaçu, mostrando que das esquinas de Miguel Couto é possível ecoar vozes que inspiram não só a cidade, mas toda a cena do rap nacional.